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Burnout e doenças emocionais como acidente de trabalho: O enquadramento jurídico
A Justiça do Trabalho já reconhece que a saúde mental tem valor jurídico

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A crescente preocupação com a saúde mental nas relações laborais tem provocado uma mudança de paradigma no Direito do Trabalho. A Síndrome de Burnout, antes tratada apenas sob a ótica médica, ou a receber atenção especial também na esfera jurídica, sobretudo quando sua origem decorre diretamente das condições de trabalho. Nessa hipótese, tem sido cada vez mais comum o enquadramento do Burnout como acidente de trabalho, com todas as consequências jurídicas decorrentes desse reconhecimento.

A Lei nº 8.213/91, em seu artigo 19, define acidente de trabalho como o que ocorre “pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.”

Já o artigo 20, inciso II, da mesma lei, equipara ao acidente de trabalho as doenças profissionais e as doenças do trabalho, desde que resultem das condições específicas em que o trabalho é realizado.

Portanto, quando o Burnout for desencadeado ou agravado pelas exigências do trabalho — como jornadas excessivas, pressão por metas abusivas, assédio moral ou ausência de pausas — poderá ser enquadrado como doença do trabalho, e, por conseguinte, como acidente de trabalho para fins previdenciários e trabalhistas.

A jurisprudência trabalhista tem avançado significativamente nesse campo. Tribunais Regionais e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) têm reconhecido o nexo causal entre o Burnout e o ambiente laboral, especialmente quando há comprovação pericial da relação entre as condições de trabalho e o adoecimento psíquico.

Em recente julgado, o TST confirmou decisão que reconheceu a natureza acidentária do afastamento de uma trabalhadora submetida a metas excessivas e cobrança contínua, resultando em quadro clínico de Síndrome de Burnout. No acórdão, o relator destacou que, ainda que a patologia tenha múltiplas causas, bastando a concausa laboral para o reconhecimento do nexo técnico.
 

“Esta Corte vem consagrando entendimento de que, para a responsabilização do empregador em virtude de doença ocupacional, agravada em razão do desempenho da atividade laboral, o nexo concausal é suficiente para configurar o dever de indenizar.”­ (TST: 10002062920175020031, Relator.: Maria Helena Mallmann, Data de Julgamento: 31/05/2023, 2ª Turma, Data de Publicação: 02/06/2023)


O reconhecimento do Burnout como acidente de trabalho gera efeitos importantes tanto no campo previdenciário quanto no trabalhista:
 
  • Estabilidade provisória de 12 meses após o retorno ao trabalho (art. 118 da Lei nº 8.213/91);
  • Conversão do benefício para auxílio-doença acidentário (B91), com recolhimento de FGTS durante o afastamento;
  • Possibilidade de responsabilização civil da empresa por danos morais e danos materiais, conforme os artigos 7º, XXVIII, da CF/88, e 927 do Código Civil;
  • Obrigação de adoção de medidas preventivas e de readaptação funcional.

O empregador tem o dever legal de preservar a saúde e segurança dos trabalhadores, nos termos do artigo 7º, XXII, da Constituição Federal e das Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho, especialmente a NR-17 (Ergonomia).

O descumprimento desses deveres pode caracterizar negligência patronal, tornando a empresa objetivamente responsável pelos danos decorrentes da omissão, nos termos da Súmula 229 do STF e da jurisprudência dominante.

O enquadramento do Burnout como acidente de trabalho representa não apenas a ampliação da proteção legal aos trabalhadores, mas também um alerta para as empresas: a saúde emocional no ambiente de trabalho é uma responsabilidade jurídica. Ignorar sinais de adoecimento psíquico e manter estruturas organizacionais tóxicas pode implicar em responsabilidade civil, trabalhista e previdenciária.

A Justiça do Trabalho já reconhece que a saúde mental tem valor jurídico — e que protegê-la não é apenas uma boa prática, mas uma obrigação legal.

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